quarta-feira, 25 de julho de 2012

Artigo sobre direito autoral e inclusão social

O Direito Autoral e a Inclusão Social
Anna Paula Mendes Oliveira*

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, baseada nos fundamentos do Estado Democrático de Direito, os valores sociais e existenciais da pessoa humana entraram na legislação brasileira no topo do ordenamento jurídico. A partir deste momento, a propriedade incorporou como requisito obrigatório para a sua existência e obtenção da tutela jurídica a obrigação de atingir a sua função social em toda a propriedade, seja ela qual for. Com a propriedade intelectual não é diferente. 

O nobre doutrinador Francisco Humberto Cunha Filho destaca que na Lei dos Direitos Autorais, nº 9.610 de 1998, pode-se observar a existência de cinco limitações à lei que protegem a função social da propriedade intelectual. Dentre elas, está a “limitação para beneficiar pessoas que estão numa situação de inferioridade, no que concerna ao acesso às obras”. Um bom exemplo para a situação citada acima, são os portadores de deficiência visual, que ao reproduzirem obras literárias, artísticas ou científicas em Braile ou qualquer outra forma para atender as suas necessidades, não estariam ofendendo os direitos autorais. 

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelas Nações Unidas e ratificada pelo Brasil em 2008, assegura o direito dos deficientes visuais a utilizarem os recursos disponíveis para assegurarem o seu direito a informação. No Artigo 24, desta Convenção, está previsto que os Estados Partes deverão garantir um sistema educacional que facilite o método de ensino do Braile, ou modos e meios de formatos de comunicação aumentativa e alternativa. Já o Artigo 30, destaca a importância do incentivo à cultura como direito imprescindível a todos os cidadãos, principalmente às pessoas com deficiência.

Ainda de acordo com esta mesma Convenção, o Estado tem por obrigação legal promover investimentos em pesquisa de novas tecnologias que facilitem o acesso à leitura para o deficiente visual. Atualmente, o sistema mais prático e moderno de leitura para as pessoas cegas ou com baixa visão são os livros em formato digital, chamados de Daisy (Digital Accessible Information System). Porém, este software não pode ser utilizado de maneira indiscriminada pelas fundações ou bibliotecas, devido às inúmeras barreiras autorais que impedem ou limitam a reprodução de livros para este formato. Como se isso não fosse suficiente, tem ainda o temor das grandes editoras com o aumento da pirataria, uma vez que estas mídias podem ser reproduzidas e salvas pela internet por mais de um usuário. Nesse caso, sim, ofenderia os direitos autorais e implicaria em sanções jurídicas civis e penais. 

No Brasil, o sistema Daisy foi financiado pelo Ministério da Educação (MEC) e difundido pela Fundação Dorina Nowill para Cegos, de São Paulo, que desenvolve e distribui livros digitais neste formato. Entretanto, de nada adianta toda essa disponibilidade, se os autores de livros não concederem licenças jurídicas em favor desse público com o objetivo de autorizar a reprodução de seu livro nesse formato acessível. Salienta-se, que este sim, seria um passo importante para o cumprimento da função social de sua obra. Evidentemente, se isso ocorresse, o direito à titularidade ainda seria resguardado ao criador.

Uma alternativa de acesso às obras que ainda não caíram em domínio público é o projeto sem fins lucrativos Creative Commons Brasil. Existente desde 2003, ele compila obras que os autores concederam licença jurídica específica para o formato Daisy. Os livros digitais no País que utilizam este método advêm principalmente de obras que estão sob o domínio público ou são de autores que concordam com a filosofia do Creative Commons Brasil. Assim, o Brasil da um grande passo importante no sentido de tornar a acessibilidade das obras uma realidade, mas ainda é pouco. Há muito para avançar.

É preciso fornecer meios para a inclusão social do deficiente visual na sociedade para que os cidadãos tenham acesso à informação da forma mais atualizada possível. Se uma maior parcela da população puder usufruir de cultura e de educação, devido aos benefícios da evolução tecnológica, haverá mais pessoas capacitadas e qualificadas. Dessa forma, se construirá um Brasil mais igualitário e acessível, que aceita e compreende a necessidade de todos.

*Assistente jurídico da Stifelman Advogados

                 

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